segunda-feira, 30 de março de 2009

Uma menina aculá


Reside em mim uma criança. Por coincidência, ou não, ela nasceu no dia 25 de abril de 1990, mas cresce de acordo com sua plena vontade. E tenho observado que de uns tempos pra cá a danadinha tem se recusado a ficar mais velha. Disseram-me que posso está diante da tão famosa síndrome de Peter Pan. Como boa internauta que sou, saí em busca da tal e encontrei a seguinte frase como descrição: “síndrome do homem que nunca cresce”.


Devo acrescentar com antecedência que se trata de uma garotinha um tanto serelepe e bem espaçosa. No melhor da infância, ela insiste em me dominar e confesso ser bem difícil dizer ‘não’ às suas vontades. Ela grita, esperneia e faz birra quando quer alguma coisa, mas é tão fofinha que se torna quase impossível não ceder aos seus caprichos. Algumas vezes, fui testemunha em cenas, no mínimo, cômicas. Como da vez em que ela tropeçou na escada do cinema, enquanto corria com um saco de pipocas na mão. É difícil dizer como as pipocas conseguiram ir tão longe. E eu bem me lembro das tantas vezes em que seu pai alertou para não correr. Houve também a ocasião em que não se conteve ao ver uma manga sobre um muro. Insistiu para que um amigo a levantasse e só sossegou quando caiu de bunda no chão. Essa foi realmente engraçada, principalmente pra quem passou pela avenida durante o incidente.


Porém, quando a situação foge completamente do meu controle, sou obrigada a dar uma de dedo-duro e recorrer à autoridade de sua mãe. É assim que, com a ajuda da matriarca e um pouco de pulso firme, volto a assumir o domínio de mim mesma.


Mas logo a mãe sai pro trabalho, e a criança, sozinha em casa, volta a aprontar. É quando eu saio saltitante, falando e rindo alto, brincando com as coisas da vida.



Gloriosas derrotas


...Não importa se somos fortes. Traumas sempre deixam uma cicatriz, nos seguem até nossa casa, mudam nossas vidas. Traumas derrubam a todos. Mas talvez essa seja a razão. Toda a dor, o medo e as besteiras... Talvez viver isso é o que nos faz seguir adiante. É o que nos impulsiona. Talvez precisemos cair um pouco, para levantar novamente...

(Trecho do seriado Grey's Anatomy)


Verdade seja dita, todo mundo carrega em si aquela coisinha que vez ou outra incomoda. Às vezes, uma cicatriz tão pequena que insistimos em dizer que ela se quer existiu. Vestígio deixado por uma ferida depois de curada, basta apenas cutucar um pouco e a tal marca volta a se tornar um ferimento aberto. Posso afirmar com precisão que camuflar essas tais marcas é até uma tarefa bem simples. Por algum tempo, é possível até esconder de si mesma. Mas negar sua completa existência é negar uma história inteira.
São como marcas de guerra, carregam significados e por mais tristes que sejam, carregam também lições de vida. E tê-las não é vergonhoso. São espécies de troféus. Significa que você se machucou, mas venceu a batalha e está ali pra contar sua história. Está ali pra narrar os acontecimentos da sua vida. Significa que viveu e se arriscou. E quer saber?! Não sei o que seria de mim, não fossem as brigas que compro, os tapas que levo e até mesmo as lágrimas que vez ou outra deixo escorrer.

domingo, 29 de março de 2009

É de comer com os olhos, só com os olhos



Duas vezes, três vezes. Na verdade, era a quarta vez que eu encarava aquela mini tortinha de morango ali. As luzes se acenderam no começo daquela paquera, toda beleza que ofuscava meus olhos, era, ainda, capaz de trazer sabor à minha boca. Assim com linda, imaginava como igualmente saborosa. E o fato de um vidro nos separar, tornava os morangos tão mais brilhantes, aquela separação criava tantas suposições, tantos pensamentos avançados. Posso dizer, eu estava hipnotizada, completamente. Então, aparece a vendedora e estraga todo aquele momento de sublime contemplação: “Moça, a senhora vai querer alguma coisa?” “Não, tou só olhando” Confesso que o “só olhando” era puro eufemismo da minha parte, como assim “só olhando”? Olhar não tira pedaço, e daquela tortinha eu já havia tirado vários. Tanto que sai dali de barriga cheia. Pronta pra dizer: “Por favor, embala o resto pra viagem, que eu já tou satisfeita”


Não, eu não estava satisfeita. Nem de longe estaria, mas até aquele momento o que tinha acontecido entre mim e a torta, bastava. Sempre preferi a conquista, e ir com calma fazia parte de todo aquele jogo. Estávamos na fase da apreciação visual e só depois dali aconteceriam outros contatos. Várias outras vezes estive naquela mesma padaria, só pra estar pertinho dela, ensaiei comprá-la só pra mim. Acontece que a essa altura nossa ligação tinha sido promovida de apenas material, para afetiva. Eu gostava dela, e só toparia levá-la pra casa quando compartilhássemos tão nobre sentimento.


Mas sabe como é, o tempo passa, a padaria não fazia mais parte do meu trajeto, muito chocolate e muito mousse na minha vida. E não é que a mini-torta de morango acabou sendo esquecida? Quero dizer, temporariamente esquecida. Bastou passar uma única vez naquela calçada e dar apenas uma olhada de relance naquela prateleira, apenas uma olhada. E não é que tudo voltou? Aquela explosão de sabores, aquela paixão arrebatadora e as mil estrelinhas piscando nos meus olhos. Dessa vez era diferente, era o reencontro. Eu e ela, ela e eu.


Apesar do breve esquecimento, eu não podia negar todo o entusiasmo de relembrar todas as ideias a respeito do seu sabor, tudo associado à beleza incomparável. Decidi que havia esperado tempo demais e aquela era a hora mais oportuna, foi assim que meu coração disse e assim foi feito: “Uma tortinha daquelas, por favor?” A vendedora que nunca tirou a cara amarrada, veio pra mim com o desprezo habitual: “Não tenho troco e aí?” “Pois me vê o troco daquele bombonzinho de caramelo” “A torta é pra comer aqui?” “Não. É pra levar” Antes de terminar o “ar” do “levar”, meu rosto se encheu de felicidade.


Sim, ela era minha! Sim, nós íamos juntas para minha casa! E os caramelos? Esses ficaram preteridos em algum canto da minha bolsa. O que importava era aquele docinho de formato perfeito, perfeitamente embalado em uma caixinha de plástico. Sai tão envaidecida, ostentando aquela “belezura” pelas ruas, andava em ziguezague, brincava de quase derrubar a torta. Tudo no maior estilo: não tenho/ tenho/ triste/ alegre.


Cheguei em casa, coloquei a MINHA sobremesa na mesa, e ia prová-la (claaaro!), entretanto, não sem antes cumprir todo um ritual. Eu que nunca tenho cerimônias para me alimentar, fiz questão de tirar a tortinha da caixinha e comê-la pedaço a pedaço. Tudo com garfo e faca, na maior delicadeza.


E finalmente, último pedaço. E aí? Os mil sabores? As estrelinhas? O supremo gosto da melhor torta do mundo? Os vários sonhos com esse dia? AM, AM, vejamos. Bem, se toda aquela euforia não tivesse sido superada, certamente eu ia querer trocar a torta sob o argumento de a confeiteira ter sofrido uma desilusão amorosa e errado a receita. Mas euforia terminada, só restava a realidade, a dura realidade: Primeiro, eu não sabia se a torta tinha sido feita realmente por uma confeiteira, e não por um confeiteiro. Segundo, não saber quem a fez, já é indicio suficiente de que eu não sei pingo d’água sobre a vida amorosa do autor. Terceiro, a desilusão amorosa era minha, só minha. Tanta expectativa para três morangos meio moles, uma papa de leite condensado insossa e uma massa, que no caso era a melhor parte.


Eu podia odiar essa sobremesa pelo resto da vida por conta da decepção causada a mim, mas acontece que ela não fez nada demais, além de ficar paradinha me olhando. A culpada era eu, exclusivamente eu. Por criar tanta fantasia e acabar frustrada na pia, lavando o prato e os talheres.


Fui para o quarto, de cara emburrada, atirei tudo que estava ocupando o lugar do meu corpo na minha cama, inclusive a minha bolsa, e dela saltam os caramelos, lembra? Justamente aqueles que eu deixei de lado, ironicamente eles. Olhei com desprezo, mas não resisti. Devorei um a um, sorrindo de toda aquela besteira que eu mesma havia inventado. E desfrutava de um momento especial como poucos, com caramelos na boca e um pensamento que mudou meu dia e os dias que seguiriam.


Não importa com quantas tortas pomposas eu paquere. Não importa quantas fantasias eu crie. Não importa localização, em uma prateleira decorada ou um canto qualquer da bolsa. O que importa é que a vida é recheada de sabores amargos, doces, apimentados, salgados, suaves e dissabores. Acrescento a vulnerabilidade do paladar, o que faz você preferir beijinho de coco e eu preferir brigadeiro. E agora mesmo, eu estar devorando uns beijinhos e você estar ai se empanturrando com brigadeiro. Se um dia eu acordar com vontade de comer maracujá com feijão, compreenda. Paladar se modifica, descobre e redescobre. Portanto, novos sabores devem ser experimentados, novas combinações de sabores, novos acompanhamentos.


Contanto, não se esqueça: algumas coisas foram feitas para serem comidas apenas com os olhos. E outras coisas foram feitas para ficar em um canto qualquer e em seguida ressurgirem com o bom e velho sabor. Porque nem todo morango que brilha é gostoso, e nem todo caramelo de troco é inteiramente refutável.

Email.doc

** Texto redigido e enviado ao final de 2007

Sabe de uma coisa, apesar de já terem passado dois meses desde o final das férias, ainda não consegui entender muita coisa. Quando penso que está tudo resolvido, que já decifrei meus pensamentos e sentimentos, vem você e bagunça rapidinho o que eu levei um tempão pra pôr no lugar. Houve momentos que achei que era carência [assim que a gente terminou, quando eu fiquei sozinha], em seguida achei que você era meu amigo e que ia ficar tudo bem. Mas aí um dia eu senti ciúmes...

Descobri que daria muita coisa pra entender o que de fato se passa na sua cabeça, e talvez mais ainda pra saber o que se passa na minha. Queria saber até onde vai a sua suposta ‘verdade’ e porque tantas vezes você beira a estupidez.

Mas o mais confuso ainda é porque, mesmo sabendo de tudo isso, eu ainda me sinto tão bem quando converso com você.

A cada conversa ao telefone que a gente tem, você entrega um pouco mais seu jogo e me deixa mais certa de que o melhor a se fazer é partir pra outra, deixar pra trás esse vestígio de sofrimento que tive, e descobrir logo qual a lição que devo aprender dessa vez. E sim, eu já até mesmo ‘parti pra outra’, literalmente, mas não consigo explicar bem ao certo porque no final das contas é com você que gosto de conversar e porque isso faz tanta diferença pra mim.

Cara, pra mim foi o cúmulo ouvir você me propor pra ser a ‘outra’. Nossa, foi ao mesmo tempo cômico, espantoso e decepcionante. Sabe, eu não me admiraria tanto se você sugerisse isso pra alguém que ficou com você uma vez perdida, mas nós namoramos e essa proposta anda longe de ser algo que eu gostaria de ouvir. É como a prova concreta de que comigo não foi diferente, que você me tratou exatamente como trata todas as meninas; eu fui um mero passatempo.

Tá certo que em um dado momento eu cheguei quase a pensar que queria ficar com você não importassem as circunstâncias. Mas não demorou pra eu perceber que você não valia se quer meu orgulho, quem dirá minha consciência.

Sabe quando a pessoa se sente um ‘coisa’?! Uma coisa, do tipo: ‘qualquer coisa’?! Pois bem, foi exatamente assim que você fez eu me senti quando ouvi você falar tão naturalmente, quase num tom de brincadeira, que queria que eu entrasse para o grupinho das suas amigas que você ‘pega’, que tinha que ser sem ninguém saber e coisa parecida... Acho que você não tem noção do que você me propôs. Sou um ser humano e como tal sou feita de sentimentos, sabia?!

E vou te dizer uma coisa: foi quando você disse isso que eu percebi que quando eu te liguei uns dias atrás, pra te contar da minha aflição a respeito do assalto aqui em casa, eu poderia na verdade ter ligado pra qualquer outra pessoa que fosse meu amigo, porque eles iriam me dar total atenção e depois eu não me sentiria mal por ter escutado coisas tão idiotas.

Não costumo me arrepender das coisas que faço não, mas se há uma coisa de que queria corrigir foi a forma que te tratei. Porra, eu sempre fui tão franca com você. Eu abri o jogo, coloquei as cartas na mesa sem medo porque esperava que você fizesse exatamente a mesma coisa comigo. Houveram sentimentos, sabia?! Eu me envolvi com você, cada palavra, cada gesto, foi tudo da mais pura franqueza. Sem exageros, mas eu abri meu coração e minha mente pra você. Pensei que a recíproca fosse verdadeira, mas eu tive uma triste surpresa.

Foi decepcionante, sabia?! O dia que tudo começou eu parei pra pensar: “Cara, que legal, ele é o que eu sempre quis. É acima de tudo um amigo, adoro conversar com ele, a gente se diverte e ele me ajuda. Poxa, tomara que dê tudo certo entre a gente, vou me esforçar pra não errar bestamente.”

Foi então que você surgiu com esse joguinho de me dá beijos surpresas, me dá buquê de jujubas, dizer que gosta de conversar comigo, lembrar de datas e me ligar de madrugada pra dizer que tava com saudades. Pra que?! Isso não é divertido, não consigo entender o porquê disso. Cara, não se brinca assim com as pessoas não, eu confiei em ti e isso era o que eu mais gostava, era o teu diferencial porque eu nunca havia confiado assim em nenhum outro menino. Eu te achava o máximo e você só se divertindo as minhas custas. E hoje eu só quero ser indiferente a ti, é tudo que eu quero, esquecer que você passou por mim.

Quando eu disse que sabia que a gente não ia voltar no segundo semestre, não pensei que fosse ganhar essas proporções. Achei que você fosse lutar pra me provar que eu tava errada, que a volta fosse melhor que a primeira vez.

Engraçado, se me perguntarem se eu te desejo o mal, vou dizer apenas que desejo que você sinta na pele as coisas que você causa aos outros, porque só assim você vai entender o real sentido de “não faça aos outros o que não gostaria que fizessem com você”.

Bem... Agora eu vou seguir o meu caminho, porque eu cansei de te esperar. Não preciso de você, não mesmo, só demorei um pouco pra perceber isso. Vou procurar alguém que seja ao menos verdadeiro comigo.

Como já mencionei, não sei quando você vai ler isso. Só não me procura mais porque eu vou tá tentando fazer exatamente o mesmo. Quer dizer, me procura sim, mas me procura só se for pra me falar alguma coisa que eu ainda não saiba, a verdade, por exemplo. Caso contrário, esquece o que aconteceu entre a gente, simplesmente faz esse favor pra mim e esquece.


P.S. Sinto saudades de você, mas sinto mais saudades ainda da pessoa que eu era antes de te conhecer.