segunda-feira, 29 de junho de 2009

Teste de tédio (leia-se: doença)


Eu estive, ou melhor, estou doente. Escrevo em um estado incontestável de fragilidade, e temo violentamente que essa fragilidade tenha se alastrado para o meu intelecto. Ficar doente me atribui um dom inigualável de questionamento, não só pelo longo e tedioso tempo que eu passo sozinha, mas pela minha atribulada mente que me redimensiona varias coisas, e depois insensivelmente me faz latejar o pensante córtex com problemas bobos, mas que para mim, residente em uma cama deleitosa, sobrevivendo a base de sopa, transvestir-se de monstro e me aterrorizar é uma tarefa bem ‘molezinha’[intensifica-se assim o tamanho da fragilidade.]

Em uma dessas noites de insônia eu me percebi seriamente engasgada e isso me fez sentir uma sensação de sufocamento, eu podia ter morrido ali de asfixia, no chão de um banheiro... No caso, o meu. Passei alguns segundos sem conseguir respirar, mas acho que o meu cérebro ainda assim continuava sendo oxigenado, porque eu fui capaz de pensar em várias coisas e conclusões brilhantes me atormentaram... Ou me deixaram intimamente aliviada.

Não cheguei a pensar em família, ou nas pessoas que chorariam no meu velório, o estranho é que eu pensei em pessoas que eu nem mesmo cheguei a conhecer e que se o meu ar não voltasse, certamente não iria conhecer e isso realmente me causou um tormento. Tecnicamente, eles não me deixariam saudades. Mas eu senti medo de não viver isso. Eu que sempre vivi pensando em não temer a morte, pensando que eu já havia deixado as coisas aqui encaminhadas... Por um instante instiguei uma forjada respiração, tentei a todo custo me desentalar. Acho que eu lutei pela minha vida, claramente não foi algo que me validou um titulo de guerreira ou coisa assim. Mas eu quis viver, quis voltar a estar presente na minha vida.

Tantas preocupações com um futuro... E eu podia imediatamente não ter um. Sei que pode parecer irresponsabilidade, mas nunca me ausentei tanto de um eu, para estar presente em outro. Deparei-me com uma resposta racionalmente desesperadora: Só se teme algo quando se desconhece o que é morrer. Você não precisa se preocupar com casamento, com profissão... Se de repente a morte pode tirar-lhe tudo e mais um pouco. Mas vamos lá, depois que eu retornei a meu estado normal, recobrei a respiração e o juízo. Voltei a pensar confusamente desesperada, nos afazeres, nas responsabilidades, nas provas, no fatídico e cíclico dia de amanhã. Esse não deveria ser o pensamento de alguém que há instantes atrás quase desfalece. Mas acredite, era. Culpa do mundo capitalista? Da fugacidade dos pensamentos juvenis? Bem, eu não sei...

Como eu ainda estou doente, me habilito de tempo o bastante para pensar no porquê disso e daquilo e para me deleitar sobre as minhas crises existenciais, crises extraterrestres, crise capilares e demais crises que possam acometer alguém que sequer reúne forças para levantar da cama. Eu não sei até quando vou viver até porque nem consultei um médico ainda. Mas parece que o medo de morrer só me ocorre na hora que eu acho que eu vou morrer [risos].

Enquanto isso, sei que vou continuar sendo a Nina pouco cautelosa... Que sempre dá passos maiores que as pernas, que parece que vai viver só até amanhã quando quer algo, mas que prolonga as tarefas como se fosse viver eternamente.
Bem, se for pra morrer. Digo que na encarnação seguinte quero ser uma borboletinha, a ideia de viver apenas 24 horas é muito atraente. [leia - se: Encontro-me entediada, por isso relevem.]

quinta-feira, 18 de junho de 2009

O Jornalismo é uma profissão, sim!


Ando abalada desde ontem, quando o STF decidiu pela não obrigatoriedade do diploma de Jornalismo. Por conta disso, decidi procurar alguém que soubesse descrever toda a minha revolta. Achei esse texto do Rogério Christofoletti, doutorando em Jornalismo na Usp e que certamente fez por merecer seu diploma.


"Se você tiver uma dor de dentes agora não vá a um dentista. Se sofrer um acidente de trânsito, não ligue para seu corretor de seguros. Se a Justiça está na sua cola, não tente seu advogado. Se estiver na hora do parto, nem pense num médico. Para curar a dor, vá até a farmácia e peça ao balconista um remedinho que dê jeito. Para resolver o problema da franquia, acione o despachante da esquina, que também poderá dar uma solução para seu processo no fórum. Por fim, se estiver na hora de o bebê chegar, chame uma parteira.

Em todos estes casos, você pode ter encontrado uma saída barata e rápida. O que não quer dizer que a solução foi a melhor, a mais segura ou a definitiva. Estes exemplos banais mostram a importância da capacitação profissional no dia-a-dia, e quanto é preciso reconhecer e defender estas condições.

O mundo mudou, as sociedades tornaram-se mais complexas, o trabalho passou a ser dividido cada vez mais e certos conhecimentos se desenvolveram de tal forma que se constituem terrenos próprios de saber. Assim, embora médicos, dentistas e veterinários estejam todos atuando na área da saúde, cada um realiza seu trabalho. Bem como arquitetos e engenheiros, jornalistas e publicitários, advogados e promotores. Uma profissão é um conjunto de conhecimentos, técnicas e formas de relação com o trabalho, que define uma atividade específica. Quando temos um grupo social que desempenha as mesmas funções temos uma categoria profissional.

Jornalistas são profissionais específicos. Têm uma visão muito particular da sua função, recorrem a técnicas para exercer sua profissão, têm uma deontologia própria que ajuda a circunscrever os limites de sua atuação no campo social do trabalho. Saber escrever um lead, fazer um perfil, editar um bloco de notícias, baixar uma página são algumas das atividades exclusivas a jornalistas. Da mesma forma, fazer petições, escrever uma defesa ou representar um cliente nas barras de um tribunal são funções de um advogado. Cada um faz o que lhe cabe. Mas e se o advogado quer escrever num jornal, ele pode? Desde que seja a título de colaboração ou como comentarista de sua área específica. Reportagens e matérias noticiosas, não. Jornalistas também podem ser consultores de advogados, certo? Certo, mas representar o cliente ali diante do juiz só mesmo o seu representante legal.

Então, é preciso entender que a discussão acerca da obrigatoriedade ou não do diploma remonta a uma série de questionamentos anteriores. A ponta do iceberg chama a atenção, mas a sua existência depende da massa de gelo submersa que lhe dá sustentação.

É preciso que não se caia em armadilhas e que não se cometam impropriedades. A primeira armadilha é confundir liberdade de imprensa com regulamentação profissional. Para não ferir a liberdade de imprensa, a juíza Carla Rister soterra as regras, as condições e as atribuições que definem a atividade profissional do jornalismo. O equívoco é tão grosseiro que corresponde a confundir justiça com capacitação profissional do advogado. Tanto liberdade de imprensa quanto justiça devem existir, precisam vigorar, mas são valores que precisam ser cultivados, reforçados e se referem a um contexto maior. A capacitação do profissional que vai exercer o jornalismo ou o direito independe da liberdade de imprensa ou do quociente de justiça. Tal capacitação é o resultado da formação técnica que teve, do repertório cultural que vem montando, de sua capacidade de resolver problemas, de sua inteligência e sensibilidade, da maturidade para encontrar soluções, enfim, de um complexo processo de subjetivação que alia condições internas e externas. Todos podem ser advogados, jornalistas ou juízes, desde que se habilitem para isso. O acesso à escola – a juíza acusa de elitismo a obrigatoriedade – é um direito, mas não é desregulamentando profissões que ampliaremos as vagas nas universidades.

Frutos do jornalismo

Um dos argumentos: o Brasil é um dos únicos países que mantêm esta obrigatoriedade, coisa que os países mais desenvolvidos simplesmente dispensam. Pois bem, o Brasil não tem as leis rigorosas que os demais países têm; o Brasil tem larga tradição de concessão de emissoras de rádio e TV como moeda política, o que não acontece acima da linha do Equador; o sistema de comunicação brasileiro é apoiado em oligopólios comerciais e oligarquias políticas, o que nem sempre se dá lá fora; como a mais poderosa e "livre" nação do mundo, a imprensa brasileira trouxe à tona reportagens que culminaram na deposição de um presidente da República; as comparações podem ser feitas aqui e acolá, mas regulamentação profissional deve ser entendida como avanço, e não retrocesso.

Para muita gente, o diploma de jornalismo é dispensável porque "as escolas são ruins", "não formam os profissionais direito" e "a técnica se aprende em poucas semanas". Mas, se as escolas são ruins, a responsabilidade não é do dispositivo legal que regulamenta a profissão, senão seria como culpar o código de ética do advogado pelas injustiças praticadas nos fóruns. Se as escolas de Comunicação são ruins, porque os veículos empregam os recém-formados? Se as escolas não formam, são as redações que ensinam o jornalismo? Quantos jornalistas experientes estão nas redações e dão suas preciosas atenções aos focas? Quantos?

As escolas podem não oferecer a formação adequada, mas é um avanço que existam e permitam que os novos profissionais cheguem ao mercado com um nível de formação formal e técnica, em vez do que era antigamente. Jornalismo era bico, hoje é profissão, que interfere na vida das pessoas comuns e na das mais influentes e poderosas. Não dá para recuar.

É equivocado pensar que jornalismo é uma questão de talento. Não é. É uma questão de rigor, de critérios, de vontade, de vocação, de indignação social, de habilidade de escrita, de agilidade no raciocínio. E isso se aprende também. O aluno pode chegar à universidade com um bom caminho percorrido, mas é na escola que vai ser bombardeado de informações e vai despertar para uma série de novos caminhos e oportunidades. Engana-se quem pensa que pode aprender jornalismo em poucas semanas. Se isso acontecesse, as escolas teriam tantos semestres? E nós, professores, teríamos que repetir tanto e tanto como se faz uma legenda ou uma abertura de texto?

O jornalismo é uma atividade complexa, dinâmica e que depende muito da formação cultural e técnica de quem o exerce. Depende de acurácia, de percepção fina, de vontade de trabalhar e refazer tarefas. Só quem está devidamente habilitado pode fazer uma extração de dentes ou escrever uma sentença de morte, bem como escrever o roteiro de uma entrevista ou ainda fazer uma matéria investigativa sobre a corrupção no Judiciário. É evidente que há exemplos de bons jornalistas que não passaram pelas universidades, mas todos estes são de tempos em que não havia tal exigência, e são claras exceções. Ricardo Kotscho e Paulo Francis, Millôr Fernandes e tantos outros são exceções dos não-formados. Do outro lado, dos que passaram pela educação formal das universidades, estão Gilberto Dimenstein, Clóvis Rossi, Caco Barcelos, Carlos Nascimento, Neide Duarte, William Waack, Paulo Markun e uma lista interminável. E neste caso eles não são exceções, são frutos dos cursos de Comunicação e da própria luta pessoal na ascensão da carreira.

Doutor, só médico

Dispensar o diploma hoje é como rasgar o documento do obstetra e reconvocar a parteira em seu lugar. Ela pode ser hábil, atenciosa e certeira, mas não teve acesso aos conhecimentos do médico, não dispõe das mesmas condições de operação e expõe as gestantes a riscos maiores. Tempos atrás, quase não havia obstetras, e sempre se recorria às parteiras. Mas o tempo passou, e jogar o diploma do médico no lixo é voltar atrás, permitir-se involuir.

O mesmo se dá com jornalistas. O jornalismo ainda está distante do que pode ser nesta república. Ainda há muito o que fazer, mas avanços têm se dado. E eles não podem ser ignorados. O tempo não pára e o tempo não volta...

Mas eu alertava no início deste texto que era preciso não cometer impropriedades, e a primeira delas, a mais banal, é chamar advogados, médicos e juízes de doutores. Doutora Carla Abrantkoski Rister, por exemplo. Mas doutores de que, se não fizeram doutorado? Advogados e delegados são bacharéis em Direito, assim como jornalistas são bacharéis em Comunicação. Curioso, não?"

segunda-feira, 15 de junho de 2009

A minha pessoa


- Ele é uma extensão de mim.

Foi assim que o defini. Simples. Compacto. Perfeito pra nossa relação. E continuei o papo informal, entre uma dose e outra do meu suco preferido e lembranças desgovernadas. Exaltando suas qualidades, contando orgulhosamente casos e acasos dos cinco iniciais anos de amizade.

- Mais importante do que apresentar alguém pro meu pai, é apresentar esse alguém a ele. É, ele é a minha pessoa.

E me peguei suspirando fundo mais uma vez, sentindo a satisfação entrando por meus pulmões. Junto com aquilo tudo, vieram também mais memórias. As boas e gostosas recordações. Aquelas que fazem a gente sentir uma pontinha de saudade acompanhada com um desejo enorme de replay.

- Ele esteve presente quando meus príncipes viraram sapos. E até em alguns raros casos onde os anfíbios se transformaram em membros da realeza.

E desisti de me concentrar na conversa que tomou um rumo desconhecido por mim. Fiquei apenas comigo mesma, aproveitando atônita os nossos melhores momentos. Ou os piores, que depois sempre acabavam resultando em boas risadas. Como um certo aniversário onde ele era meu príncipe ausente ou uma certa festa onde ele foi de bom grado meu objeto.
Houveram promessas também. Claro, sempre há. Prometi, por exemplo, que ele será o padrinho do meu primeiro filho. E também há aquela clássica: “A gente vai pro baile da terceira idade juntos, tu com tua esposa chata e eu com meu marido rabugento. Mas tem problema não, dançamos um forrozinho juntos.
Meu irmão. Sempre desejei um quando criança e o ganhei de presente. Bem melhor do que encomenda. Fizemos planos, devaneios na maioria das vezes. No terceiro ano planejamos nos mudar pro Maranhão, estudar e morar juntos. Ele lavaria a roupa e eu faria a comida. Ao fim da discussão, quando concluímos que isso não tinha como dá certo, decidimos mesmo comprar comida congela e mandar lavar a roupa na lavanderia.

Num grito de alerta, acabei despertando da viagem no túnel do tempo e retornando pra realidade onde uma aula indesejada me aguardava. Mas antes disso, pagar o suco de maracujá sem leite era no mínimo um ato de cidadania... E fui pro caixa. Ao abrir a carteira, estava ele, a minha pessoa em uma foto 3x4 que me acompanha desde muito tempo. Sempre presente.

- Eita lezado que eu amo!