quarta-feira, 12 de maio de 2010

Para minha avó


Tem certas coisas que soariam melhor se fossem cantadas ao pé do ouvido, como uma doce canção de amor. Não sei fazer melodias e muito menos tenho a voz afinada e mesmo a senhora dizendo que eu falo como um passarinho, não me convenceu. E eu dou, não a linda canção de amor que a senhora merece, mas algumas palavras reunidas, que querem dizer justamente aquilo que eu cantaria desafinando e com os olhos marejados: o nosso amor.

Peço desculpas, se em algum momento, eu faltar com o sentido. É difícil escrever com tanta emoção, ou talvez seja mais fácil, pois alguns pensamentos me antecedem e explodem como bombinhas de São João em um peito bombardeado de emoções. Tem sido tudo tão estranho...

Desde que o Paulo Matheus ligou para a Tia Dineide contando o que havia acontecido, não pude pensar em qualquer outra coisa, que não representasse o fim. “Acabou?” “A pessoa que eu mais amo no mundo partiu, e agora?” A sensação se revelou angustiante, uma coisa que entre coração e cabeça, céu e terra, não se descreve em palavras, não se descreve mesmo nos maiores mistérios dessa coisa que se compreende como vida. Mas eu ainda tinha a senhora em mim, tinha seu cheiro e o leve toque do seu joelho na minha mão esquerda. Seus olhos me olharam no último instante possível e não era tão complicado ter paz, muito menos respostas.

No momento em que a cabeça passou a funcionar guiada pelo coração, uma linda história de amor se formou em meus pensamentos... E histórias de amor não se acabam. Não acabou!

Cronologicamente, não lembro como lhe conheci, queria contar que foi em uma linda manhã de vento suave e sol fraco, quando estivemos juntas colhendo flores e a senhora sorriu para mim, e eu por achar seu sorriso encantador, lhe amei desde aquele instante. Mas não, não foi assim. Mamãe diz que desde sempre seu colo era especial para mim, que seu aconchego me embalava e eu dormia tranqüila quando tinha a senhora.

Pra ser sincera, só lembro as brigas por causa das idas ao seu Arão e do quanto a senhora gostava de entrar na frente da TV e estacionar ali, impedindo qualquer outra visão, só os robes de cor clara e sua silhueta gordinha. E eu já lhe amava nessa época, amava porque aprendi que se ama a família. E, além do quê, lhe amar nem era tão difícil para mim, mesmo com tantos resmungos, eu reconhecia algo de forte, que quando criança eu não compreendia bem, porque criança só ama. E não é só porque eu passava o dia inteiro naquela sua casa rosa, é por mais, é porque a vida se encarrega, mesmo com suas curvas e desencontros, de unir corações amigos.
Durante muito tempo, sua presença foi ofuscada, aliás, refaço, digo que sua presença foi resguardada para o momento certo, a propósito, tivemos nosso momento certo e é isso que eu chamo de destino.

Vovô era um ser lindo e calmo, e qualquer pessoa normal diante dele, parecia chata e indócil demais, a concorrência era severa. Tinha também a excepcional Mana, com o jeito nervoso e zeloso mais cativante do planeta. E nossos primeiros atritos foram exatamente por causa dela, por causa do seu ciúme infantil, vovó. A criança ali era eu, mas a senhora insistia nas ceninhas e no apego exagerado, eu só sorria, por entender que quando se tem uma filha brilhantemente cuidadosa, tudo que se quer é que todos os carinhos e atenção estejam voltados pra você.


Foi pelos olhos amorosos de Mana, que eu passei a lhe enxergar com olhos de mãe, você era uma criança adoravelmente ciumenta, era um bebê pra gente. A senhora persistia em me provocar, eu não me importava, porque nós todos tínhamos a Mana, eu, a senhora, a mamãe, o popó, a família inteira, ela era nosso grande elo, nosso grande coração acolhedor. É, mas corações grandes têm planos igualmente grandes, e foi assim, ela precisou assumir esses planos maiores e nos deixou. Mas me deixou preparada, eu já sabia ser sua mãe.


Por falar em mãe, minha mãezinha, sua caçula sem juízo e de rezas milagrosas, ficou desnorteada, quando a irmã amada partiu e mesmo querendo dar todo o apoio que era possível, sem fugir as obrigações que não cessaram, teve que nos deixar sozinha em muitos momentos. Não me recordo de tempos mais difíceis, eu, a senhora e aquela casa carregada de lembranças. Todos os dias nós tentávamos fazer diferente, conversar outras coisas, assistir outros programas e construir uma relação de confiança.


Agora, eu já sabia exatamente porque lhe amava. Qualquer pessoa que conseguisse sobreviver àquela invasão de tristeza sem se maldizer da vida e ainda distribuir paz e serenidade, já teria a minha admiração. Mas se, além disso, essa pessoa conseguisse oferecer consolo e carinho aos demais, além da minha admiração, teria o meu amor, meu mais sincero amor.


Quantas vezes choramos juntas nas longas madrugadas? Eu olhava para a senhora, e pensava: ‘que injustiça! Não foi direito fazer isso com ela, eram dois olhos velhinhos inundados de lágrimas, isso não foi certo... Não foi’ Mas aí a senhora me respondia com outro olhar: ‘ a vida é mesmo assim... ’ Eu nunca sabia o que falar, não podia suportar senão sem abaixar a cabeça, toda aquela dor que era sua, mas era também de quem lhe amava. Mas aí, quando o choro partia de mim, a senhora segurava firme minhas mãos e me convidada a rezar, ensinando sobre os desígnios de Deus. E naquela situação, eu só chorava a saudade de alguém amado, a senhora além da saudade, chorava a ausência de uma parte importante de seu corpo.


Eu falava de destino, falava em um momento certo, mas nunca imaginei que ele fosse acontecer justamente no momento mais complicado de nossas vidas. E hoje, eu percebo que não haveria momento mais apropriado, eu sabia cuidar da senhora, sabia dos remédios, das comidas, dos carinhos e de admiração, sabia ficar impressionada com o seu passado de lutas e o presente de superação.


Teresina agora era seu lar e muitos apostaram que a senhora não resistiria a tantas mudanças violentas, mas a senhora na insistente mania de surpreender positivamente, voltou a sorrir, não que houvesse deixado algum dia, mas voltou a viver como antes, com caretas, implicâncias e muito bom humor, embora não sem saudades e recordações. A senhora estava ali, com novas rugas, novas limitações, mas ali, com a implacável sede de vida que lhe era característica. Como a água, transparente e suave, se moldando a um novo recipiente, a uma nova vida.


Essa vinda para Teresina fez com que parte de nossa família ganhasse a oportunidade de lhe conhecer mais de perto, ai a senhora foi invadida de mais amor e mais cuidados. Todo mundo querendo ficar com a vó espirituosa e cheia de alegria, eu podia ter morrido de ciúmes, porque a senhora era quase só minha até então, mas eu ficava satisfeita demais, eu sempre gostei de dividir alegrias e a senhora era a minha maior. Netos, bisnetos, filhos, sobrinhos, médicos, enfermeiros e amigos, todo mundo irremediavelmente apaixonado! Por que a senhora ultrapassava o que chamam de uma pessoa cativante, a senhora era mais, era alguém muito mais!


E eu via tanta gente a minha volta, tanta gente que tinha, como se diz, tudo para ser feliz. E ainda assim, procurando motivos para reclamar da vida e empecilhos para amar. E então, eu pensava na sua história, no quanto a vida havia sido traiçoeira com a senhora e tudo que eu via era amor em seu coração, paz em seu olhar e felicidade para quem ousasse entrar em contato com seus pensamentos.


Meu Deus! Eu queria que todo o mundo soubesse que podia haver felicidade mesmo diante dos maiores desatinos, porque a senhora me mostrou assim, mas foi a vida que me ensinou que isso não era pra todo mundo, infelizmente, porque não se ensina ninguém sobre amar a vida e sobre ter fé. Só a vida pode ensinar e ela lhe ensinou.


Sua pureza quase infantil, até me deixava constrangida, era duro dizer que o mundo não era tão lindo, quanto a senhora merecia que fosse. Não que eu não lembrasse de sua fortaleza, mas ai eu me via tendo que responder o porquê de algumas pessoas insistirem em fazer mal a outras, e nesse momento seus olhos eram ainda mais piedosos, o que responder ao coração mais puro do mundo sobre a obscuridade de outros corações? Minha única vontade era lhe abraçar e dizer: “Porque nem todo o mundo é lindo e honesto assim, princesa”.


Era desconcertante e eu me sentia suja por saber das maldades que eu não queria que a senhora soubesse. Mas dava pra esconder alguma coisa de sua curiosidade? Não, não dava! Nada lhe escapava, desde os segredos alheios às notícias dos jornais. Tudo a senhora sabia. E se não sabia, procurava meios de descobrir, utilizando aquela sua inteligência incomum e o dom de elaborar razões. Toda a família ficava inquieta com medo de suas reações: “com essa a mamãe vai ficar arrasada” “tadinha da vovó...” Mais que nada, lá estava a senhora com a sua sublime capacidade de entendimento: “a vida é mesmo assim...” E a gente que acabava aprendendo, ou só admirando mesmo, porque não é nada fácil encarar a vida com tanta simplicidade. Mas a maldade não, essa a senhora não entendia. É... Não se pode entender sobre aquilo que não se conhece, não de dentro pra fora... Compreendo.


Recordo-me de um dia tenso em que ficamos juntas, foi esse dia véspera da minha prova de vestibular. Toda aquela expectativa sobre decidir o meu futuro, porque é assim que as pessoas dizem sobre o vestibular, e era assim que todo mundo me dizia. Decidir o futuro é algo muito assustador e eu estava assustada. Então a senhora deixou que eu pintasse suas unhas para diminuir a tensão, eu, quando lembrava o que me esperava no dia seguinte, borrava nas laterais, além dos borrões, ainda inventei de desenhar umas florzinhas, que eu disse que eram suas filhas.

A senhora sorria e elogiava minha coordenação, quanta adulação, hein vovó? Todo mundo que viu suas unhas, se esforçou pra acreditar que aquilo eram flores... E foi nesse momento, que eu entendi que a decisão da minha vida não estava em uma prova, não estava em profissão, ou qualquer coisa parecida, a minha vida era decidida a todo o momento, principalmente quando eu escolhia a quem amar e sobre quem eu deveria cativar comigo. A senhora estava comigo! Eu não precisava de uma aprovação, eu só precisava da sua felicidade e carinho. Passar no vestibular não era nada, se eu não pudesse dividir essa alegria com a senhora, se eu não tivesse sua alegria comigo.


O que significava um vestibular ou qualquer coisa mundana diante da magia celestial de seu sorriso? Sempre preferi magia à coisas mundanas, o que tiver de acontecer por essa bandas da terra, só se justifica se trouxer algo de mágico consigo. Ah, mas eu fui aprovada e isso de fato nem me importava tanto, ou o mínimo que você pode se importar, quando está diante de muitas pessoas queridas felizes com você, tomando para si sua felicidade, essas pessoas incluem primordialmente a senhora. Essa sensação foi inenarrável e eu nunca tive a oportunidade de lhe agradecer por ela, porque foi a senhora quem me fez cair na real e enxergar com as devidas proporções aquele momento, além de me deixar fazer macacada em suas unhas e me proporcionar os abraços mais aconchegantes, que me deixava tranqüila para enfrentar um exercito inteiro, se assim precisasse.


Ah vovó, a sua imagem, seu amor, seu rostinho lindo, me incentivaram e me incentivam a ser alguém melhor e o amor que eu distribuo ao resto do mundo, é reflexo do nosso amor e da sua simplicidade que me deixou alguém mais leve, capaz de distribuir palavras de carinho a estranhos e ser sincera sem ofender. Eu tento ser grata com a vida, porque dentre tantas pessoas espalhadas por aí, eu fui ficar cara a cara justamente com a mais especial. Tentar retribuir para o planeta, o amor que eu recebi da senhora, é a menor coisa que eu devo fazer, não acha? Pois é, sempre me sinto em dívida com a vida e a culpa é sua. . .


E o que falar do criador de tudo? Aquele sobre quem a senhora tanto me falou.. Mas quer saber? Tudo que eu aprendi sobre Deus com os seus ensinamentos bíblicos e as orações ao anjinho da guarda, não se comprara ao testemunho da existência dele, dado através da senhora. Sim, Vó, a senhora me fez sentir a viva presença dele em minha vida, perante seu abraço. A senhora passava os braços pela minha cintura e de forma carinhosa deixava meu corpo segurar o seu, e Deus estava ali juntinho da gente. Era uma benção dele, o amor. Era o presente dele a mim, ter o seu amor, sua presença em minha vida. Deus lhe deu de presente a toda nossa família, e eu só tenho a agradecer.


Se o amor e a capacidade de amar nos fazem ser aquilo que somos: seres-humanos! São as histórias e lembranças de amor, que nos fazem ser aquilo que não somos: imortais! Em histórias de amor, não há lugar para fins, porque sempre que houver uma pessoa disposta a contar e outra disposta a ouvir, as histórias de amor não se perderão.


Viver histórias de amor é, de alguma forma, ir ficando por aqui... Ir deixando um pedacinho de vida em cada doce recordação. Sua linda passagem pela terra, me segura firme no chão e deixa meu pensamento voar ao seu encontro, e quando eu vejo alguém desacreditado, me dá logo uma imensa vontade de falar sobre a gente, sobre a senhora. Cada vez que eu paro para relembrar tudo que passamos juntas, encontro uma coisa nova para amar, me diz se isso pode ter fim? Eu respondo: Não!


Pois é, vovó... Ainda bem que construímos uma história de amor, e ainda bem que muita gente que eu amo, tem uma história sua para contar também. Somos várias histórias reunidas, que lhe trazem aqui, quando a saudade aperta. Usando do seu jeitinho “a vida é mesmo assim”, eu me conformo, mesmo com a saudade de abraçar forte seu corpo fofinho e envergado. Ah, peço desculpas se só agora me dei conta de que apesar das suas reviravoltas milagrosas, um dia a senhora teria que ir, mas não falo em uma ida definitiva, a senhora ainda está aqui comigo! Nosso amor é infindável e quando eu lembro todas as suas lições configuradas em Deus, seu abraço e sorriso - me fortaleço com a certeza: Eu te amo com todas as minhas forças e isso nunca acabará!


domingo, 4 de outubro de 2009

JOGO HISTÓRICO


Foi em 2000, na final da Copa Mercosul, o time vascaíno terminou o primeiro tempo perdendo por 3 x 0, para o Palmeiras, e no maior jogo de todos os tempos e em toda a história do futebol mundial, o VASCO DA GAMA virou o placar para 4 x 3, com um gol de Juninho Paulista e três de Romário, sendo o do título marcado aos 48 minutos do segundo tempo, não dando chance de reação para o Palmeiras, em pleno Parque Antártica e com um jogador a menos, já que Júnior Baiano havia sido expulso.


Quantos torcedores começaram a torcer pelo Vasco após essa linda lição de garra? Das minhas ótimas lembranças da infância vascaína, essa é especialmente encantadora. “ É hoje! 20 de Dezembro de 2000, final da Copa MERCOSUL e o time da Nina vai jogar” – falas do papai. Tudo que eu mais gostava se reunia ali: meu pai, minha mãe, Vasco, churrasco, paçoca e guaraná Simba (Queria que meus irmãozinhos tivessem incluídos aí, mas eles não quiseram ver o jogo, comeram e foram dormir).


Eu, então, com 10 anos, me desesperava com a apatia do Vasco diante do Palmeiras e de todo aquele estádio lotado gritando pela equipe alviverde. Eu nunca fui muito boa em aceitar torcida contra e poxa, eles tinham o estádio transbordante de ‘verdinhos’ e o time ia pra cima do meu pobre Vasco com tudo, como se diz. 25 jogadores do Palmeiras contra 3 do Vasco – assim me parecia, já que eu não entendia nada de regras ou técnicas, o que me restava era a intensidade com que cada um jogava, de um lado, o Palmeiras em uma final e, do outro, o Vasco em uma pelada depois de um dia de trabalho.

Com um pênalti, o Palmeiras abriu o placar, toda a minha raiva se converteu em angustia e dali em diante, só me restava chorar miudinho a cada gol que o Vasco sofria, meu pai que é botafoguense, mas antes disso é pai, sofria junto comigo e tentava me consolar dizendo: “É futebol, Nina. O Vasco tá fora de casa, é complicado!” . Um, dois, três... Já somavam três gols. Era uma final e embora eu não entendesse muito bem de regras ou técnicas (como já contei), sabia que aquilo era um número quase que insuperável. Eu falei ‘quase’...

Pior do que ver algo que não lhe agrada, é ver algo que não lhe agrada em repetição e além do mais comentado, cruelmente comentado. O “show do intervalo” pisou com sandálias de navalha no meu coração cruzmaltino, não me lembro dos comentários certinho, mas era algo como: “Inacreditável a soberania do Palmeiras frente ao Vasco...”! “Palmeiras coloca as duas mãos na taça!” E eu só pensava: “Não é justo, não é justo...!”. Nesse exato momento o choro ficou barulhento, e fez tanto barulho que mamãe começou a insistir para que eu fosse dormir, segundo ela, já era tarde e o Vasco já havia perdido mesmo, era bom que eu dormisse e esquecesse todo aquele “trágico” jogo, não fazia bem para uma criança ficar se desgastando à toa. Mamãe que sempre apoiou minha torcida nos jogos, por ser um momento de descontração de todas as minhas angustias infantis, achava que aquele jogo representava um sofrimento desnecessário. Mal sabia ela...


Contra a vontade da mamãe, lavei o rosto e voltei rapidinho pra sala, sentei silenciosamente no sofá, tomando a posição de “caramujinho camuflado”, com as pernas pra dentro da camisa do pijama e um olhar forçadamente desconcentrado pra TV – tudo arquitetado para que mamãe não se importasse mais com minha presença. O Vasco voltava a campo e nos primeiros minutos, o time já ensaiava uma reação, um quase gol, ameaças e ataques – eu só suspirava alto, em uma mistura de esperança e cansaço. Milagrosamente saiu um gol, eu não me lembro de ter comemorado, mas meu pai, sim! Papai me sacudia forte e eu mal conseguia tirar as mãos geladas do abraço com as pernas. O Palmeiras voltava a tentar dominar a partida, mas o Vasco contava com o Romário, né? E o baixinho fez o segundo. Dessa vez papai me deu um choque elétrico de apertões e dessa vez meio que comemorei, com um meio sorriso, uma meia cara feliz, quase o empate.


Após o gol, um jogador do Vasco recebeu cartão vermelho e foi expulso. Papai com sua intolerância com falta de disciplina de jogadores, logo reclamou. E naquela situação papai era quem sabia das coisas ali, papai falou que ele ia complicar o time por conta de uma infantilidade, eu me limitava em acreditar piamente. E piava de agonia, mas nada muito exagerado, mamãe podia me dar um cartão vermelho da sala também. E eu não era infantil, pra aquela altura do jogo ser banida - eu não era infantil, entendam. Mesmo com um a menos, o Vasco partiu forte em busca do empate e não é que aconteceu? Papai ficou absolutamente extasiado, confesso que também fiquei eufórica durante alguns segundos, entretanto a minha cara de choro não se desfez, nenhuma palavra pronunciada, só olhares ansiosos e cheios de expectativas trocados com o meu pai, ele só respondia com olhos contentes: “Vai dar certo! Vai dar certo!”.


Acho que meu pai nunca imaginou minha enorme paixão por um time que nem ao menos era o dele, mas isso não o impedia de cruzar os dedos e ficar com a cara mais confortadoramente animada do planeta, só para que eu me tranqüilizasse. Papai que antes torcia exclusivamente por minha causa, se enfeitiçou pela raça demonstrada pelo MEU time e torcia porque achava merecida uma vitória. Éramos dois torcedores enlouquecidos, ele - empolgado na eletrizante partida e eu – chorosa com o coração batendo apertado.


Quando o último gol foi marcado nos acréscimos, papai me abraçou bem forte e dizia emocionado: “Nina, esse teu time é bom mesmo!” Eu chorava sorrindo, um tio vascaíno me ligou pra comemorar junto comigo e mamãe explicou para ele a minha situação: “Aldir, essa menina quase me enlouquece aqui, ainda bem que deu tudo certo. Porque eu não sabia como ela ia dormir hoje, se esse Vasco de vocês perdesse”. Um instante único: meu pai abraçado comigo, mamãe emocionada por minha causa e meu tio do outro lado da linha gritando algo que eu não entendia, mas compreendia como saudações cruzmaltinas.


Eu que sempre tive uma vontade secreta de ‘entrar’ na TV, nunca vi essa vontade tão aquecida quanto naquela noite. Eu queria abraçar todos os jogadores, queria segurar a taça, participar da chuva de papel picado e cantar meu amado hino em um coro entusiasmado. Mãe é mãe, mãe flamenguista de filha vascaína é vascaína, o que prova que ela sempre soube das coisas. Eu era uma criança e os meus ânimos foram ao extremo aquele dia, meus sentimentos foram do ápice da tristeza, para a ponta da mais profunda alegria, e em um desmaio a noite acabou para mim.


Apaguei no sofá da sala e papai me transferiu no colo para meu quarto. Sonhei com os jogadores, com o hino, a taça, o gramado – tudo muito embaralhado, mas existia uma faixa: VASCO CAMPEÃO!... E acordei (ao meio-dia, para não perder o costume) sorrindo, mas sem saber se meu sonho havia acontecido na realidade. Constatei que era verdade (que ótima verdade!), quando na mesa do almoço, papai disse: “Essa menina besta chorando ontem à noite, sempre soube da vitória do Vasco...” Eu só sorria toda orgulhosa para os meus irmãos. E esperava logo que o almoço acabasse, para que eu pudesse me retirar da mesa. “Melhor do que ver algo que lhe agrada, é ver algo que lhe agrada em repetição e além do mais comentado, magnificamente comentado. Eu fui correndo pra TV, não podia perder o Globo Esporte, né? E esse não ia pisar com sandálias de navalha no meu coração, ia só fazer carinho, só carinho... haha”



terça-feira, 22 de setembro de 2009

É que eu amo demais...



Era uma vez a minha vida, sem graça e meio batidinha. Uma menina coadjuvante em sua própria história, os contos eram sempre os mesmos. Faltava ação, faltava paz, faltava; sobretudo amor. O que a falta de amor, não faz a uma mulher? (me denomino assim, porque a palavra ‘mulher’ exprime uma feminilidade incrível; entretanto sei bem que não passo de uma menina, e sinceramente não acho isso dispensável).

Uma mulher carente fica frágil, suscetível as maiores crises, com mania de implicância – tudo fora do lugar... Vaidade passa de um critério supérfluo á obsessão, com a rapidez com que a falta de amor destroça um coração saudável. Beleza sempre parece essencial para galgar um amor, principalmente nas horas que é de um amor que se sente falta. Tudo que está ausente é exatamente o necessário para o bendito amor aparecer.

Embora eu tivesse um amor, não era o amor- amor, entende? Eu ia levando uma relação morna SOZINHA há alguns anos. Assumo envergonhada: eu sofria de acomodação, eu me contentava em amar pela metade. (Isso é lamentável em todo seu feitio). Amar pela metade me fazia desprezível e era bem assim que eu enxergava a maioria das coisas lindas dessa vida, com desprezo.

Hesitei muitas vezes em ser feliz, em abandonar a estabilidade de uma vida amorosa medíocre, que me fazia medíocre. Imaginem só, a menina intensa em tudo que faz, amando pela metade, fracassando e achando isso natural. Fracassar é natural, mas achar que vai fracassar para sempre é um erro. Achar que o amor chegou ao topo, é outro erro, um erro de grandeza maior, inclusive. O amor nunca chega ao topo, o amor sempre pode crescer, pode crescer porque eu ainda acredito na melhora das pessoas. Mas eu era uma pessoa que não melhorava, por isso o amor não crescia. Eu queria mesmo era que o relacionamento acabasse sem minha intervenção. Calma aí, como eu seria protagonista de uma história que o destino tomava todas as decisões? Hein?

Por sorte, o destino se encarregou de me deixar BEM abusada, porque não é só o excesso que causa abuso, a falta também tem esse poder, até mesmo porque eu tinha excesso de falta. Justamente isso! Não importa, só sei que a felicidade fez ‘ding-dong’ na minha campainha e eu abri. Abri de alma lavada, de coração livre, querendo urgentemente amar, abri a porta e lá estava alguém muito especial. Ele me encontrou e eu o encontrei, sem meios e fins [esse encontro, nós dois, esse amor – essa era a música da época], e de repente tudo fazia mais sentido. Como a vida era linda naqueles tempos...! Eu tinha minha própria história de amor, tudo se encaixava perfeitamente.

MAS “todo grande amor só é bem grande, se for triste...” Nesse sentido, eu sofri, mas fui muito feliz, feliz como nunca havia sido até então (com alguém). Nesse encontro eu descobri o real sentido da palavra “perda”, soube como acontece o temido “ir atrás” e ainda reconheci o significado maior da expressão “CRESÇA!”. Enfrentei “olhares invejosos”, “intrigas”... “receios”. Eu abusei da coragem, fui covarde quando necessário e até me deixei ficar vulnerável – Não é exatamente isso que o amor exige? Eu fui com tudo e sem nenhum arrependimento.

E quando “crescer” tornou-se requisito essencial para o prolongamento daquele amor: Eu cresci! Cresci porque era necessário, mas tomei apreço e cheguei a um estágio superior, desproporcionalmente maior do que aquele romance exigia. Ficar junto é complicado, ou se está junto, ou não está (e felizmente, eu sou leal demais para estar junto sem estar). A essa altura de amadurecimento, eu não suportaria levar outro namoro sozinha, não depois de saber como o amor acontece, não com tantas lembranças boas na cabeça na iminência de virarem aversão. Sai sofrida, mas ocupando o papel de protagonista da minha própria história, a sensação de arrependimento podia acontecer, mas em razão do atrevimento, não mais por acomodação, isso por si só já me fazia alguém tão melhor.

“amor é coisa de ir, mas também é coisa de voltar...” Eu fui! Dessa vez não vieram carências, nem crises, nem manias de implicância, veio reconhecimento, uma coisa que eu buscava há muito. É difícil olhar no espelho e não saber quem é você, porque “ser você” se confunde com “estar com alguém” – Eu era Nina, mais do que nunca, sem traumas e concussões, totalmente em paz com a pessoa que eu havia me tornado. Não falo de “bola cheia”, nem de “auto-estima dando piruetas no céu”, falo de autoconhecimento. Eu que conheci o amor querendo “urgentemente amar”, porque temia que meu coração secasse (que tola!). Percebi que amor nunca vai me faltar... Se faltar, antes que meu coração seque, eu já morri sufocada. Amar, para mim, é algo embutido, indissolúvel.

Eu amo naturalmente, tal qual respirar... Amo a minha nova forma de encarar o amor. O amor me modifica e eu modifico a forma como ele opera na minha vida. Dessa vez, imagino tudo muito livre, tudo com muita calma. Nada mais de desesperadamente tomar posse, não sou mais a mesma de alguns seis meses atrás, essa nova Nina aprendeu que amar é coisa séria, que sentimento prende mais que qualquer outra coisa e que transparência conquista.

Se antes, deixar o destino agir por conta própria me fez perder tempo e me afastou do tão sonhado cargo de protagonista. Hoje, novamente, deixo que ele tome conta de mim, não que eu não saiba para aonde ir e não interfira incisivamente, mas é que ele tem sido tão meu amigo, tão parceiro – digo: agimos em conjunto. Na MINHA história tem Nina, tem destino, floresta, seres encantados, fada madrinha, bruxa má (ECA!), esquilinhos do castelo, cisnes e príncipe. Ta, falta o felizes para sempre, eu sei... Mas quer saber? Eu tenho amor, 19 anos e uma vida inteira pela frente. “Felizes para Sempre” é um Adeus, é a última página do livro sendo lida, é a última cena da novela. Vou amar interminavelmente, estou amando e logo logo não serei a mesma.

[ESPERAAA] Fiz uma ligação: Se amar me transforma e eu amo sempre, é justamente por isso que eu não costumo ser constante. E a galera falando em bipolaridade... “É que eu amo demais, gente”... “É que eu amo demais...”

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

- ... acabou de entrar

Pililim. (Pseudo-onomatopéia do barulho do MSN)

- ... acabou de entrar.

Aquela janelinha surgindo de repente foi um alívio praquela menina que ainda encarava seu mundo virtual um tanto paralisada e analítica. Parecia que ele previa que ela precisava dele, afinal ele raríssimas vezes apresentava-se online. Ela sabia que podia contar com ele. Sempre pôde.

Paralalam. (Pseudo-onomatopéia para chamar atenção)

- Preciso de você.

Talvez ela tenha iniciado a conversa em meio a algumas lágrimas. Mas quem precisava saber disso? Ali era só ela e seu ciber espaço e não havia como ter conhecimento do que verdadeiramente ocorria entre as quatro paredes do seu quarto lilás e branco. O pedido de socorro era sincero, mas o seu verdadeiro estado de espírito era um segredo até pra ela própria.

Como tantas outras vezes, ele lhe atendeu prontamente. Era eficiente quando preciso. Mais do que isso, ele lhe fez sorrir. Um sorriso ainda molhado é verdade, mas um tímido sorriso de alívio. Não que a situação tenha se tornado magicamente mais simples, mas era tocante como ele insistentemente buscava provar pra garota que ela estava errada quanto aos seus sentimentos. Uma tentativa admirável de tornar as coisas mais simples para ela mesma.

- Eu adoro quando você faz isso, sabia?! Quando tenta simplificar meus sentimentos, mostrar que eu estava sentindo outra coisa, só pra tudo ficar mais fácil.

Depois da declaração, ela mudou de ânimo e mudou também de assunto. Voltaram a fazer planos. Era sempre assim quando um dos dois enfrentava algum problema: eles faziam novos planos. Alguns pouco realmente se realizavam. Mas isso era o que menos importava já que o bom mesmo era imaginar as coisas se encaixando perfeitamente.